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agressão econômica: uma violência estratégica cometida contra
"os condenados da terra", por Carlos Melo
"Acredita-se que, para estancar na raiz as potencialidades insurrecionais, basta liberar o potencial mimético dos escravizados. Enquanto os recém-libertos gastarem suas energias tentando ser os senhores que nunca serão, as coisas nunca poderão ser de outra forma do que são. A repetição do mesmo, o tempo todo e em todo lugar, será a regra." - Achille Mbembe
para iniciarmos nossa reflexão, é importante dizer que quando me refiro ao sistema colonial, não estou me referindo a um período histórico. no desenvolvimento de minhas pesquisas e produções, o colonialismo é tratado como um sistema de dominação e exploração que está em constante movimento. sistema este, que renova suas tecnologias e suas formas de dominação dependendo do contexto que está inserido e de suas necessidades.
a partir disso, analiso que vivemos sob o jugo de um sistema alicerçado em ganância, perversão, extração, exploração e violências. um sistema de desigualdades estruturado para beneficiar uma parcela mínima da sociedade.
essa minoria, chamada de elite econômica, apropria-se de quase toda a “riqueza” extraída da terra. vale destacar, que a extração desta “riqueza” só é possível através da exploração e manipulação dos “condenados da terra”.
a manutenção da estrutura colonialista é realizada a partir e através da violência. a violência é cometida de diversas formas e atinge os “condenados da terra” fisicamente, psicologicamente e emocionalmente.
tratam-se violências que tem como objetivo invadir a personalidade profunda dos explorados e debilitar seu equilíbrio psíquico, seu caráter e sua vontade.
é inerente ao colonialismo “fabricar seres de dor, pessoas cuja existência é permanentemente invadida por uma gama de Outros ameaçadores. Parte da identidade desses seres é estarem sujeitos à desdita da constrição, é estarem constantemente expostos à vontade do Outro”.
nesse sentido, a vulnerabilidade é uma das ferramentas mais eficazes para manter o domínio da minoria sobre a maioria. por isso, uma das formas de violência mais estratégica cometida pelo sistema colonialista, é a agressão econômica.
a agressão econômica intensifica a vulnerabilidade dos sujeitos ao colocá-los no “desemprego, no subemprego, do que resulta a subversão de sua organização familiar e de sua personalidade, mantendo-os sem recursos ao atendimento de suas mínimas necessidades de moradia, saúde, educação, alimentação e assim por diante”.
as consequências da agressão econômica foram intensificadas durante a pandemia de Covid-19. de um lado, a elite econômica potencializou seus lucros. o relatório “A Desigualdade Mata”, publicado pela Oxfam em janeiro de 2022, aponta que os dez homens mais ricos do mundo ganharam US$ 15 mil por segundo, ou US$ 1,3 bilhão por dia, apenas nos dois primeiros anos da pandemia. além disso, surgiu um novo bilionário a cada 26 horas.
do outro lado, o relatório mostra que as desigualdades estão contribuindo para a morte de pelo menos 21 mil pessoas por dia, ou uma a cada quatro segundos. o acúmulo de riquezas também é responsável por colocar mais de 160 milhões de pessoas em situação de miséria.
“os dez homens mais ricos do mundo tem hoje seis vezes mais riqueza do que os 3,1 bilhões mais pobres do mundo”, Katia Maia.
no que se refere ao Brasil, 55 bilionários acumulam uma riqueza total de US$ 176 bilhões. o relatório da Oxfam aponta que os 20 maiores bilionários do país têm mais riqueza (US$ 121 bilhões) do que 128 milhões de brasileiros (60% da população).
como consequência, o sistema de desigualdades fez com que a miséria e a fome aumentassem exponencialmente no Brasil. em dezembro de 2020, “55% da população brasileira se encontrava em situação de insegurança alimentar (116,8 milhões, o equivalente à soma das populações de Alemanha e Canadá) e 9% se encontravam em situação de fome (19,1 milhões, superior à população dos Países Baixos)".
os dados revelados pelo relatório da Oxfam, demonstram a situação causada pelo sistema colonial, que como dito, trata-se de um sistema alicerçado em ganância, perversão, extração, exploração e violências.
dentro desse sistema, “os condenados da terra”, vivem “num estado de suspensão”, essa vida em suspensão “é, em muitos aspectos, a lei do nosso tempo, a da economia”. dessa forma, esses sujeitos são colocados ao lado daqueles que não são vistos. não são vistos porque acredita-se que não há nada para ver.
Carlos Melo
Nascido em Fortaleza (CE), em 20 de Março de 1988, Carlos Melo é pesquisador de Filosofia Ubuntu e De(s)colonialidades; Escritor; Professor; Produtor Cultural; Idealizador do Projeto Descolonizando Pensamentos; Idealizador do Grupo de Estudos Rotas de Fuga; Idealizador e Editor da Pluriverso Edições Independentes; Estudante de Licenciatura em Filosofia pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP).